O artigo de hoje é sobre um assunto que já conversamos por aqui, mas de tão importante vale “amassar o mato”. E quem vai falar sobre isso hoje é a Jéssika Bezerra, uma aluna daquelas, que nos faz ver o quanto o nosso esforço como docente vale a pena, sabe?
Olhar verdadeiramente para o outro e conseguir sentir e se colocar no seu lugar é uma capacidade humana especial. Quando conseguimos estabelecer esta conexão, abrimos o caminho para a construção de relacionamentos, pois é extremamente reconfortante saber que não estamos sozinhos com nossos desejos, sentimentos e emoções. Quando falamos que o ser humano é um ser social, que vive em sociedade percebemos também que algo nos leva a nos agruparmos com nossos semelhantes. Aparentemente nos tranquiliza saber que outras pessoas podem compartilhar as mesmas emoções e sentimentos conosco. Por isso, quando estamos muito tristes procuramos nossa mãe ou alguém que nos entenda. Agora sabemos que esta capacidade de ter empatia, de se colocar no lugar do outro, é uma das habilidades mais sofisticadas do nosso cérebro. Esta capacidade é processada por um sistema denominado neurônios espelho, presentes no córtex pré-motor e córtex parietal inferior.
Os neurônios espelho permitem que espelhemos a ação de outra pessoa em nosso cérebro, como se estivéssemos realizando a ação apenas ao observar. Eles podem enviar mensagens para o sistema límbico ou emocional em nosso cérebro. E por isso o cérebro traduz o que vemos em sensações: fazemos careta ao ver outra pessoa se machucar, ou choramos ao imaginarmos o sofrimento de outros. Desse modo, estes neurônios têm o papel de permitir que nos conectemos com o outro, por meio do reconhecimento dos sentimentos ou emoções, o que chamamos de empatia. Esta palavra tem sido repetida exaustivamente nas escolas, cursos corporativos, no trabalho, em casa: assim parece que é a chave para resolver vários problemas. Nunca ouvimos falar tanto a palavra empatia. Já sabemos sobre sua importância para estabelecer bons relacionamentos e uma convivência harmoniosa, e por meio da neurociência podemos agora juntar as pequenas peças e ir além da sua importância para compreender o seu funcionamento.
Eu me emociono facilmente, pode ser assistindo Chaves – que eu sei que é uma ficção – ou vendo uma reportagem de um ataque na Síria. É estranho ver que outras pessoas não ficam afetadas como eu, a ponto de chorar. Eu posso assistir dez vezes a cena do Chaves sendo expulso da vila e choro as dez vezes. Então quer dizer que algumas pessoas utilizam mais os seus neurônios espelho e se conectam com mais facilidade ao outro? Ou em algumas pessoas a atividade dos neurônios espelho é encoberta pelos neurônios responsáveis por atividades de raciocínio lógico? Que mostram que aquilo é uma ficção, ou algo muito distante? Pode ser também que não estejam dando a mesma atenção? Não sabemos!
Contudo, percebo que conhecer este sistema de neurônios, responsáveis pela empatia é algo relevante para a prática docente. Não vamos falar de neurônios espelho em sala de aula, mas sabendo da sua importância poderemos estimular o seu uso. A empatia é uma ferramenta que auxilia na mediação e construção de bons relacionamentos. Quando o professor consegue se conectar com seus alunos, reconhecendo seus sentimentos e emoções, tem maiores possibilidades de ter respostas positivas deles. E acredito que este sistema de neurônios espelho, como nossas demais conexões neurais, pode ser estimulado tanto nas relações de professor com o aluno, do aluno com o professor e também do aluno com seus pares. Como em um cinema, exibindo um bom filme do qual saímos chorando, o professor precisa criar ambientes favoráveis para que seus alunos possam exercitar a empatia. Pode ser ouvindo e observando atentamente, pode ser com a inversão de papéis, com dramatização ou simulação de um cenário. Lembrando que, como a neurociência nos indica, um elemento é fundamental para que guardemos uma informação em nossa memória é a atenção. . É necessário criar condições para ver, ouvir e sentir. E sabendo disso, o professor pode fazer com que seus alunos se conectem a ele também.
Por meio da empatia é possível criar as conexões e fazer com que o aluno possa entender a lógica do outro, seja o colega ou o professor. Da mesma forma, o professor poderá se empenhar em compreender a lógica do aluno, quando este está entediado ou irritado, ouvindo e observando-o. O adulto normalmente perde esta empatia com o jovem, talvez pelo fato de enxergar as coisas de forma mais racional, desconsiderando os sentimentos complexos desta fase. Mas neurologicamente reproduzimos comportamentos. E neste sentido, também podemos pensar na educação pelo exemplo. Estes neurônios nos permitem captar as sensações e estados emocionais dos outros, espelhando movimentos, emoções, humores e comportamentos de outras pessoas, e também aprendendo pela imitação. Logo, é importante para o professor, que passa boa parte do seu dia com seus alunos, saber que vai influenciar significativamente na vida de seus alunos, não apenas com aquilo que fala explicitamente, mas, sobretudo, com suas ações e comportamentos: ver, ouvir e sentir atentamente o outro, talvez seja uma das lições fundamentais.
Jéssika Aquino Bezerra é graduada em História e mestre em História Social pela Unifesp. Atualmente, trabalha no Senac no apoio a ações para formação continuada de docentes. Seu desejo é a busca e aprofundamento de novas práticas e metodologias que possam transformar a educação e vê a Neurociência como uma dessas possibilidades.
Ah, você se lembram de que logo no começo do artigo eu falei que a Jéssika é uma daquelas alunas que valem a pena? Caso tenham um olhar atento na formação dela, verão que ela não é Neurocientista. Então por que ela escreveu um artigo relacionado a esse tema? Porque além de ser engajada na busca por novas práticas e iniciar os seus estudos em Neurociência, o artigo dela nos mostra como essa área de estudo pode estar ao alcance de todos que queiram, dediquem-se e acreditem que o diálogo entre a Neurociência e a Educação é possível.
Até mais 🙂